Após a gravação de "Apesar de você" (1970), interpretada pelas
autoridades como uma ofensa a Armando Falcão, Ministro da Justiça
do Brasil à época, os censores do Serviço de Censura de Diversões
Públicas tornaram-se bastante rígidos com Chico Buarque. Todas as
letras assinadas pelo compositor passaram a receber o carimbo
"interditada".
Para escapar da censura, especialmente após as proibições impostas
ao álbum "Calabar", Buarque criou o heterônimo "Julinho da Adelaide", que passou
a assinar as canções. A estratégia
funcionou e músicas como "Acorda amor", "Milagre
brasileiro" e "Jorge Maravilha" passaram numa boa
pelos censores.
Para não despertar suspeitas, Chico Buarque inseriu a letra de "Jorge
Maravilha" entre duas estrofes de um texto maior, como se
fosse uma suposta canção de amor romântico. Com esse formato a
composição foi encaminhada à Polícia Federal e passou batida.
Como não tinha a obrigação de gravar todo o texto aprovado, as
estrofes inicial e final foram completamente descartadas, restando
apenas o trecho que interessava.
"Jorge Maravilha" foi interpretada pelo artista pela
primeira vez em "O Banquete dos Mendigos", projeto
idealizado e dirigido por Jards Macalé e gravado no dia 10 de
dezembro de 1973 no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Durante muito tempo
circulou uma lenda de que a canção teria sido feita para o
ex-presidente Ernesto Geisel e a filha dele, uma grande fã de
Buarque - especialmente ao verso "Você não gosta de mim, mas
sua filha gosta". Mas, na verdade, segundo o próprio Chico,
o verso irônico e a música referiam-se a uma situação vivida por
ele: em uma declaração para a Folha de S.Paulo, em 1977, o cantor
deu o seguinte veredicto: "Aconteceu de eu ser detido por
agentes de segurança (do Dops), e no elevador o cara pedir
autógrafo para a filha dele. Claro que não era o delegado, mas
aquele contínuo de delegado".
Nesta gravação de 1974 Chico canta e - de quebra - conta uma
deliciosa mentira sobre Julinho da Adelaide! História boa, música
boa e Chico exalando charme por todos os poros!
Por Kênia Fernandes, em 30/03/16
Por Kênia Fernandes, em 30/03/16